Integrados, segmentos colocam conhecimentos e recursos para auxiliar nas diversas pontas do sistema de saúde, buscando melhor enfrentamento ao avanço do novo coronavírus
Da união entre academia, indústria e governo estão surgindo no Espírito Santo iniciativas extremamente necessárias no momento de enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. São medidas que envolvem a aplicação de ciência, tecnologia, recursos materiais e expertise de instituições de ensino e setores público e privado em ações essenciais para conter o avanço da Covid-19 no Estado.
As medidas vão desde produção de itens essenciais para o sistema de saúde – como protetores faciais, manutenção e calibragem de equipamentos hospitalares – à aplicação de conhecimentos e recursos tecnológicos para ajudar no fluxo de pacientes em hospitais e estudos sobre o comportamento local do vírus.
Uma das iniciativas vem do Centro Tecnológico (CT) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Professores se mobilizaram para identificar formas de atuar em meio à crise de saúde. Foi então que desenharam um programa com seis linhas de ação (veja abaixo) voltadas ao fornecimento de suporte ao sistema público no enfrentamento à pandemia.

150 mil protetores faciais
Algumas ações já estão a pleno vapor como a produção dos protetores faciais para serem usados por trabalhadores da rede pública de saúde do Estado e o conserto e manutenção de equipamentos hospitalares. A expectativa é produzir 150 mil equipamentos de proteção até meados de maio. Até agora também já foram consertados e/ou calibrados 35 dos 40 aparelhos enviados pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) como ventiladores pulmonares, monitores e medidores. Leitos hospitalares controlados automaticamente também serão reparados.
A ideia inicial era fazer as máscaras em impressoras 3D, no entanto, devido à grande demanda, foi necessário ajustar o processo. “Na impressão 3D teríamos condições de produzir algumas centenas de máscaras por dia. Mas o governo, por meio da Secretaria de Saúde (Sesa), apresentou uma demanda de 150 mil máscaras. Em discussões com professores da Ufes e empresas ligadas a esse grupo identificamos a necessidade de mudança do processo de produção para um processo através de injeção, sem necessidade da impressora 3D, o que nos daria condição de produzir cerca de3 mil máscaras por dia, o que vem sendo feito hoje”, explica o engenheiro Rafael Sartim, do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da ArcelorMittal, empresa que doou a matéria-prima e contribuiu ainda com recursos técnicos e humanos para o desenvolvimento da ação.
Rafael, que também é professor do Departamento de Tecnologia Industrial (DTI) da Ufes, aponta a satisfação em colaborar e ver a rapidez com que a proposta se transformou em algo concreto. “Com o fato de estarmos todos conectados conseguimos trabalhar e conversar numa proposta e, rapidamente, cada um com sua expertise e com seu papel, seja teórico, em mão de obra, equipamentos ou financeiro, colocar uma ideia no papel, tirar do papel e transformar numa realidade tecnológica, em um produto em prol da sociedade”, comemora.
Além da finalidade humanitária a Findes entende que a medida também é fundamental para reduzir impactos dos efeitos da pandemia na economia. “A proposta da indústria é retornar às atividades de forma responsável, seguindo todos os protocolos de saúde. Mas precisamos primeiro organizar o sistema de saúde, ter condições para que o comércio volte, o consumo volte e a gente possa produzir”, defende Raizer.
Outra etapa do processo, a montagem e distribuição dos protetores faciais, fica a cargo do Centro de Pesquisa, Inovação e Desenvolvimento do Espírito Santo (CPID), ligado à Secretaria da Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação Profissional (Secti). Após esse processo tudo é direcionado à Sesa que encaminha os produtos às unidades.
Modelagem hospitalar
Outra preocupação nesse momento é quanto à expectativa de crescimento vertiginoso de pacientes e o risco de colapso do sistema. Nesse sentido, outra ação fundamental desenvolvida com apoio da academia é a modelagem da demanda hospitalar. Na prática, é um estudo de capacidade para orientar como unidades de saúde podem atuar e quais os recursos materiais e humanos necessários para atender a demanda gerada pela pandemia, como número de leitos, distribuição da demanda de acordo com o nível de complexidade dos casos, necessidade ou não de montar hospitais de campanha, entre outros aspectos.
A ação envolve professores e alunos das áreas de engenharia de produção e elétrica, não só da Ufes mas das federais mineira e catarinense. “É importante frisar que a Ufes não está parada. Nós só não estamos tendo atividades presenciais, mas estamos atuando”, ressalta a professora Patrícia Cardoso, coordenadora da frente responsável pelo estudo da modelagem hospitalar.
Com o trabalho de professores, técnicos e voluntários, além da ajuda que vem de fora do meio acadêmico, ensino e prática se aliam numa corrente essencial no momento de crise. A ação coordenada pela equipe da Ufes só é possível graças à união de esforços da academia com outras instituições de ensino como o Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e setores público e privado.
O professor e diretor do CT, Geraldo Rossoni Sisquini, é quem atua na interlocução da universidade com os outros atores do processo. “Começamos a juntar as pecinhas para as coisas funcionares de forma mais organizada”, conta sobre a articulação para enfrentamento à pandemia.
Um dos apoios vem do movimento Indústria do Bem, capitaneado pela Federação das Indústrias do ES (Findes). A iniciativa mobiliza empresas a colaborarem com medidas necessárias para estruturar o sistema público de saúde e ajudar a sociedade no enfrentamento à pandemia no Estado. “O movimento tem duas vertentes, uma é para angariar recursos materiais ou financeiros e a outra é o apoio a ações desenvolvidas no sentido de ajudar o sistema de saúde, como a fabricação dos protetores faciais”, explica o vice-presidente da Federação, Luciano Raizer Moura.
Foi a articulação da indústria que viabilizou, por meio de parcerias, a matéria-prima para a produção dos protetores – sete toneladas de acetato e oito toneladas de plástico – a fabricação dos moldes, a logística para transporte do material, a disponibilização de linhas de produção para beneficiar o plástico e de máquinas para o corte do acetato para produzir os equipamentos usados na proteção dos cerca de 80 mil profissionais do sistema público do ES.
Assessoramento
Outra forma de auxiliar as ações para barrar o avanço da Covid-19 no Estado é por meio do conhecimento científico aplicado à prática. A epidemiologista Ethel Maciel e o matemático Etereldes Gonçalves, ambos do corpo docente da federal capixaba, prestam assessoramento à sala de situação do governo. “Junto com equipe do Instituto Jones dos Santos Neves vamos atuar na elaboração metodológica do estudo epidemiológico que será realizado no final de abril e início de maio para avaliar a prevalência de infectados pela doença no Estado. Isso auxilia o governo na tomada de decisões durante a epidemia”, explica a professora Ethel.
Essa é uma das linhas de ação previstas na atuação do Comitê Operativo de Emergência para o coronavírus (COE-Ufes). Com atuação inicial prevista para 60 dias, o comitê pretende orientar as decisões da universidade e alimentar um site que será criado para disponibilizar à população informações sobre a doença e ações relacionadas à epidemia.
Outra linha é o acompanhamento da evolução epidemiológica da Covid-19 e discussão de propostas para frear a disseminação do vírus na UFES, além de atuar com os órgãos oficiais da saúde para a prevenção da disseminação do vírus.