No passado, a elite burguesa mateense conseguiu enriquecimento às custas do comércio e exploração de seres humanos, usados como escravos, e que ainda sofriam com chicotadas, espancamentos rotineiros e estupros
A elite econômica de São Mateus (ES), no seu passado longínquo, teve a sua existência marcada por praticar torturas sistemáticas e constantes nos negros sequestrados na África e desembarcados no porto daquela cidade do Norte do Espírito Santo. A invasão portuguesa em São Mateus se consolidou em 1544, quando efetivamente os europeus se apropriaram das terras indígenas.
A historiadora Maria do Carmo de Oliveira Russo fez um estudo para a USP intitulado “A escravidão em São Mateus (ES): Economia e Demografia (1848 -1888”. A análise teve como orientador, o professor da USP Horacio Gutiérrez. “O presente estudo tem por finalidade abordar aspectos demográficos e econômicos da escravidão em São Mateus, região do norte do Espírito Santo, na segunda metade do século XIX”, inicia no resumo do documento.
Ela lembra que o porto da vila de São Mateus (cidade a partir de 1848), é considerado um vetor de desenvolvimento por onde escoava a produção agrícola regional, principalmente a farinha de mandioca e, posteriormente, o café, abrigando também um ativo mercado de escravos”, inicia no resumo do documento.
Média de preços de escravos comprados e vendidos por ano em São Mateus (1863-1887)
Compra, venda, hipoteca, doações e até aluguel de escravos
Para que o estudo fosse fiel à realidade, Maria Russo narra que consultou e analisou documentos cartoriais da cidade -livros do Notariado ou Livro de Notas – no Cartório de 1º. Ofício, onde se encontram registros de alforrias, de compra e venda, hipotecas, doações, aluguel de escravos, dentre outros, relativos ao período de 1863 a 1888.
São Mateus (ES) em 1914, com um navio vapor atracado | Foto: Arquivo/Revista Fon-Fon, edição 28
O negro sequestrado em suas aldeias na África, trazidos pelos portugueses, era tido como uma mercadoria, que exigia registro em Cartório. “O comércio de escravos figurou como mais um elemento na estrutura comercial que se montou em São Mateus ao longo dos anos. Este comércio não gerou fortunas no século XIX naquela região, apenas fez parte delas, ou gerou possiblidades de outros investimentos quando as negociações revertiam em dinheiro”, assinala a historiadora.
Documentos avulsos – negócios com escravos em São Mateus (1863-1887
Ela conta como os tabeliães de São Mateus se prestavam a ser cumplices da barbárie de compra e venda de seres humanos, fazendo o registro, em documento “oficial”, do que nos dias de hoje é um crime contra a humanidade. “Sendo assim, constatamos que as escrituras públicas de compra e venda de escravos da segunda metade do século XIX apresentam geralmente a mesma estrutura textual, contendo, de forma sequencial, os seguintes dados e informações:”
,a) nome do cativo, nome do vendedor, nome do comprador, valor da comercialização;
.b) data de emissão, lugar onde é lavrada;
.c) endereço do vendedor e do comprador;
.d) nome, sexo que é inferido do nome, origem, cor, idade, naturalidade, estado civil e profissão/ocupação do escravo;
.e) observações quanto à forma de quitação, informes sobre o recolhimento do imposto de meia sisa – paga pelo comprador que, no ato, apresenta a certidão da meia siza emitida na Coletoria. Meia siza era um imposto cobrado pelo Império sobre a negociação de seres humanos escravizados e o texto deste Alvará, de 3 de junho de 1809, pode ser conferido clicando aqui.
.f) nome das testemunhas, quando existentes;
.g) pessoas que assinam a rogo das partes contratantes, quando estas têm impedimentos;
Idade dos escravos comprados e vendidos em São Mateus (1863-1887)
Comércio de escravos contou com 15 empresas em São Mateus
Além dos comerciantes individuais de seres humanos negros escravizados, a elite econômica de São Mateus vislumbrou a necessidade de criar empresas especializadas nesse tipo de comércio. A historiadora fez um levantamento minucioso e conseguiu identificar que a partir de 1863, haviam 15 dessas firmas atuando no mercado de São Mateus. São elas:
.1 – Alves, Ferreira & Cia;
.2 – Faria & Bastos;
.3 – Fonseca, Rios & Cia;
.4 – Fundão & Irmãos;
.5 – Faria, Cunha & Cia;
.6 – Fundão Júnior & Cia;
.7 – Guimarães, Gaiato & Cia;
.8 – José Joaquim Almeida Fundão & Cia;
.9 – Leonel Joaquim de Almeida Fundão & Cia;
.10 – Luis José dos Santos Guimarães & Cia;
.11 – Morgado, Rios, Guimarães & Cia;
.12 – Rios & Cia;
.13 – Veiga & Cia;
.14 – Simões, Faria & Cia; e
.15 – Joaquim Lopes & Irmão.
“Entre estas, ao que nos foi possível averiguar, a Faria, Cunha & Cia é uma das primeiras firmas comercializadoras de produtos agrícolas e escravos da região, que, embora sediada no Rio de Janeiro, tinha como espaço de atuação o porto de São Mateus. Esta firma era composta pelos sócios Manoel José de Faria e Reginaldo Gomes da Cunha, respectivamente, irmão e cunhado do fazendeiro escravagista Antonio Rodrigues da Cunha, que devido a sua relevância econômica ganhou como agrado do imperador da época o título de “Barão de Aimorés.”
Na lista de maiores credores nas negociações de escravos em São Mateus (1863-1887) consta em 3º lugar o escravagista Barão de Aimores
O escravocrata que virou barão
O escravagista Antônio Rodrigues da Cunha ganhou o título de Barão de Aimores através de decreto imperial de 24 de agosto de 1889, aos 55 anos de idade. O título era comum ser dado pelo Império às pessoas ricas, como uma troca de favor, garantindo assim o apoio político da elite econômica ao regime imperial. Ele veio a falecer em São Mateus no dia 30 de setembro de 1893. Ele foi o pioneiro na produção de cana-de-açúcar naquela região e mudou de ramo, para o plantio de café, com o fim da escravidão.
Com o café passou a usar a mão-de-obra barata de imigrantes, principalmente de italianos, em um sistema de meeiro, onde os seus trabalhadores reclamavam porque o preço pago pela “meia” era irrisório e muito abaixo do mercado. O escravocrata também foi major da Guarda Nacional Imperial.
Imagem do escravagista Antônio Rodrigues da Cunha, o Barão de Aimorés | Imagem: Museu Histórico Municipal de São Mateus
“O major Antonio Rodrigues da Cunha também se destaca neste sentido, considerando que o mesmo se encontra em 3º lugar dentre os maiores credores nas hipotecas e penhoras (onde investiu cerca de 23:000$000 rs./ 23 mil contos de réis e aceitou 18 escravos como parte das garantias dos empréstimos), sobressaindo-se como o maior comprador de escravos em São Mateus, além de ocupar a 10ª posição entre os maiores vendedores de escravos no âmbito regional”, assinala Maria Russo.
Ilustração atribuída à princesa africana Zacimba Gaba, sequestrada e transformada em escrava em São Mateus| Imagem: Arquivo
Escravocratas de São Mateus torturaram e escravizaram princesa africana
As histórias da elite econômica do passado de São Mateus são de arrepiar. Um dos casos que passou a ser conhecido nacionalmente foi o sequestro, em 1690, de Zacimba Gaba foi uma princesa da nação Cabinda, em Angola. Essa região africana foi dizimada pelos bárbaros comerciantes de seres humanos portugueses. A princesa veio parar em São Mateus, onde foi comercializada.
O comprador foi o escravocrata português José Trancoso, que se apropriou de uma área imensa de Norte do Espírito Santo, ultrapassando o Rio Mucuri, que segundo relato de uma publicação da Ufes sobre a princesa africana, as terras desse escravagista ultrapassavam 30 Km de distância a partir de São Mateus. Uma pessoa maligna, José Trancoso praticava chicotadas e espancamentos diários contra a princesa e o seu povo, que havia sequestrado juntos.
Ao se referir a compra da princesa, o historiador capixaba Maciel de Aguiar faz o seguinte relato na sua publicação Zacimba Gaba – Princesa, Escrava e Guerreira: “O fazendeiro português José Trancoso arrematou, no Porto da Aldeia de São Matheus, na Capitania do Espírito Santo, “com cerca de mais de uma dúzia de negros d’Angola”, uma “negrinha de feições finas e olhos esfumaçantes”, sem imaginar, por certo, que estava levando para a sua fazenda – uma sesmaria de terras que ultrapassava o rio Mucuri, “há umas seis léguas para o norte” – a “negrinha” que iria ser uma das precursoras nas lutas dos negros contra o regime de escravidão na região.”
Os relatos históricos contam que durante anos Zacimba foi cruelmente castigada pelo escravagista José Trancoso por não aceitar atender os desejos do fazendeiro. Um dia, ela foi arrastada da senzala até à Casa Grande, onde foi interrogada pelo senhor, que queria saber se era verdade o boato que se espalhava por todos os lugares de que ela era uma princesa.
Depois de dias e muitas chibatadas, ela confessou sua verdadeira identidade: Zacimba Gaba, princesa da nação de Cabinda. E foi estuprada depois disso. Com o passar do tempo, a jovem princesa, aprisionada na Casa Grande, sob ameaça permanente, castigos e sendo violentada pelo fazendeiro e pelo capataz, crescia e tomava coragem para enfrentar, sozinha, o senhor. Ela tinha proibido que os negros tentassem libertá-la e passou a elaborar planos de fuga e de vingança. Zacimba também sofria ao ouvir os lamentos de seu povo sendo cortado no chicote, amarrado no tronco e levado aos ferros, durante os anos que se passaram.
Uma das armas mais poderosas e silenciosas que os escravos usavam contra os senhores ou feitores que lhes impunham castigos desumanos e humilhantes era o envenenamento. Um dos venenos mais utilizados pelos escravos era extraído da cabeça da “Preguiçosa”, uma cobra temida pelo seu veneno mortal, característica do Vale do Cricaré.
Mosaico da Ufes em homenagem à princesa africana Zacimba Gaba, na sua lutas conta o antiracismo | Imagem: Divulgação/Ufes
Esse veneno era usado por matar com pequenas doses e não logo que ingerido. Os senhores daquela época, até pegarem confiança em quem preparava a comida, obrigava os escravos a experimentarem tudo primeiro. Se não acontecesse nada, o senhor comia. Para não envenenar ninguém do seu povo, Zacimba levou anos para conseguir finalizar o seu plano. Um dia aconteceu, o senhor da fazenda caiu envenenado, e logo Zacimba deu a ordem para os escravos da senzala invadirem a fazenda. Todos os torturadores foram mortos e a família do senhor da fazenda foi poupada. Zacimba fugiu junto com os outros negros e criou seu próprio quilombo.
Zacimba Gaba é considerada uma heroína por ter enfrentando o escravagista torturados e de o derrotar. Por isso, o campus da Ufes em São Mateus a homenageia na luta antirracista. Com os dizeres “Liberdade e Consciência”, a Ufes mantem na frente do Restaurante Universitário do campus daquela cidade o mosaico que simboliza o compromisso da Universidade com a defesa e o respeito às diversidades étnico-raciais, de gênero, culturais, sociais e regionais.
Durante a sessão ordinária realizada na última segunda-feira (24), a Câmara Municipal de São Mateus prestou uma emocionante homenagem ao ex-vereador Jozail Fugulim, que faleceu na última quinta-feira (20)
Durante a sessão ordinária realizada na segunda-feira (24), a Câmara Municipal de São Mateus prestou uma emocionante homenagem ao ex-vereador Jozail Fugulim, que faleceu na última quinta-feira (20). A homenagem foi marcada pela presença da filha de Jozail, Isabella Fugulim, que, visivelmente emocionada, prestou um comovente depoimento sobre a trajetória do pai. Ao final, a bandeira de São Mateus foi entregue a ela pelo presidente da Câmara, ao lado dos demais vereadores.
Os Vereadores e as Vereadoras da Câmara Municipal de São Mateus, representando o povo deste Município, manifestam irrestrito pesar e solidariedade à esposa Rosilene Wandel Rei Morais, a sua filha Isabella Wandel Rei Morais Fugulim e demais familiares, rogando a Deus que conceda força e consolo diante de tamanha perda.
Em homenagem a seu legado, a Câmara Municipal aprovou o Projeto de Lei nº 002/2025 que denominam a Central de Ambulâncias do Município e Projeto de Lei nº 003/2025 denominando a galeria anexa ao Plenário da Câmara com seu nome, eternizando sua memória na história local.
Ainda na sessão, foi aprovada por todos os vereadores a Moção de Pesar nº 011/2025, destacando a trajetória ética, combativa e comprometida de Jozail com a vida pública e com os interesses da sociedade de São Mateus.
Quem foi Jozail?
Jozail Fugulim nasceu em Nova Venécia, Espírito Santo, em 18 de setembro de 1970, filho dos pequenos agricultores Antônio Fugulim e Maria Coletti Fugulim. Mudou-se para São Mateus em 1972, onde construiu sua vida e carreira.
Em 1990, iniciou sua trajetória no serviço público ao ingressar na Polícia Militar do Espírito Santo, atuando na Companhia de Polícia Ambiental. A partir de 1997, passou a integrar o Corpo de Bombeiros Militar, dedicando-se por quase 27 anos à segurança e bem-estar da população capixaba.
Em 2016, Jozail foi eleito vereador de São Mateus pelo PTB, destacando-se por sua postura ética e compromisso com a fiscalização dos gastos públicos. Durante seu mandato, concentrou-se em questões críticas para a sociedade mateense, como recursos hídricos, saúde, educação e segurança.
Após seu mandato como vereador, Jozail assumiu o cargo de secretário-adjunto de Finanças da Câmara Municipal de São Mateus, continuando a servir a comunidade com dedicação. Infelizmente, em 4 de março de 2025, sofreu um acidente e veio a falecer em 20 de março de 2025, aos 54 anos, no Hospital Estadual Roberto Silvares.
Sua partida foi profundamente sentida pela comunidade de São Mateus, que reconheceu sua dedicação ao serviço público e seu impacto positivo na cidade.
Após ser acionado pelo prefeito Marcus da Cozivip e vereadores, deputado marcou reunião com a Eco-101 no dia 3 para cobrar soluções para o município
O deputado estadual Fabrício Gandini (PSD), presidente da Comissão Especial de Fiscalização da BR-101 na Assembleia Legislativa, fez um alerta hoje (24), do plenário da Casa, sobre a precariedade da ponte sobre o rio Cricaré, em São Mateus, e criticou a ausência da duplicação do trecho Norte da rodovia no novo contrato de concessão. O parlamentar cobrou providências urgentes da Eco-101 e da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A situação da ponte preocupa as lideranças locais, incluindo o prefeito Marcus da Cozivip (Podemos), que fez questão de gravar um vídeo no local e enviar ao deputado para reforçar a gravidade do problema.
Grupo de São Mateus, encabeçado pelo prefeito Marcus da Cozivip, esteve no gabinete do deputado Gandini: parceria para solucionar problemas. Créditos: Wilbert Suave
“Essa ponte tem mais de 70 anos e está cedendo. Não há passagem para pedestres nem ciclistas, e não sabemos quando foi a última manutenção. Por aqui passam carretas e toda a produção que faz a cidade crescer”, alertou o prefeito.
No vídeo, o vereador Wap Wap (Pode) também destacou a urgência da situação: “A estrutura da ponte é antiga e precisa de uma reforma imediata.” Além dele, o presidente da Câmara Municipal, Wanderlei Segantini (MDB), o também parlamentar Raphael Barboza (PDT), e o secretário de Defesa, Ricardo Borgo, participaram da comitiva que inspecionou a ponte.
Para Gandini, é essencial garantir a segurança da população e evitar tragédias como a que ocorreu recentemente no Tocantins, onde uma ponte desabou e causou mortes.
“Não queremos que o mesmo aconteça em São Mateus. Por isso, trouxe essa discussão para o plenário da Assembleia e marquei uma reunião com a Eco-101 no dia 3 de abril, para obter informações concretas sobre a segurança da ponte e um possível projeto de modernização”, afirmou.
O parlamentar também criticou o novo modelo de concessão da BR-101, cujo leilão ocorrerá no dia 26 de junho.
“O pedágio mais caro do Espírito Santo está em São Mateus e, inacreditavelmente, a nova concessão não prevê a duplicação da rodovia no trecho entre Linhares e o Norte do Estado. Isso é inaceitável! Como justificar essa cobrança sem melhorias para os motoristas?”, questionou.
Caso a duplicação continue fora do projeto, Gandini defende que pelo menos parte dos 41,4 km de faixas adicionais previstos no contrato sejam destinados a São Mateus, garantindo mais segurança e fluidez no tráfego.
FAIXAS
“Precisamos entender onde essas faixas serão construídas e cobrar que São Mateus seja contemplado. Se não haverá duplicação, que ao menos haja uma alternativa para melhorar as condições da rodovia no município.”
Gandini reforçou que acompanhará de perto o novo contrato para evitar um novo ciclo de promessas não cumpridas.
“A ANTT demorou 10 anos para admitir que a concessão era inviável. Agora, precisamos garantir que os compromissos sejam cumpridos e que a BR em São Mateus não continue sendo um gargalo logístico, com mais acidentes e mortes. Vamos seguir cobrando soluções concretas!”