Medida que consta em projeto enviado à Ales se deve a crescimento da folha de pagamento incompatível com situação orçamentária da Corte
O Tribunal de Justiça (TJES) encaminhou para a Assembleia Legislativa (Ales) o Projeto de Lei (PL) 267/2020, que freia o avanço na carreira dos servidores concursados. A matéria propõe progressão mais lenta na tabela de ascensão profissional e ainda a supressão dos três últimos níveis das tabelas de vencimentos.
A matéria prevê que a partir deste ano as progressões na tabela funcional dos servidores do Judiciário capixaba não ocorrerão mais a cada dois anos, mas a cada quatro. Além disso, o servidor habilitado só terá efetivamente progressão na carreira, que ocorre em 1º de julho, caso o Estado esteja em crescimento econômico capaz de absorver o impacto na folha.
A concessão do benefício dependerá do desempenho da Receita Corrente Líquida (RCL) aferido pela média dos três quadrimestres imediatamente anteriores a sua abertura comparada à média dos três quadrimestres do período antecedente. A promoção será condicionada à manutenção do percentual da despesa total com pessoal do Poder Judiciário no limite igual ou inferior ao que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Para a apuração desse limite o valor da promoção deverá ser somado à estimativa da despesa total com pessoal para o mês de sua concessão e para os onze meses imediatamente posteriores. A apuração do limite será ainda estimada considerando a receita anualizada até o mês de junho do ano da concessão da promoção acrescida do percentual de sua evolução apurada no mesmo período.
Se a conta for desfavorável o processo de promoção ficará automaticamente adiado para o ano seguinte. Conforme o PL, o adiamento na concessão do benefício não gera direito à promoção retroativa.
Inspeção
O presidente do TJES, Ronaldo Gonçalves de Sousa, diz que a necessidade de “readequação” da Lei Estadual 7.854/2004, que instituiu o atual plano de carreiras e de vencimentos dos servidores do Poder Judiciário capixaba, foi determinada pela Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) em inspeção realizada em fevereiro de 2019.
Segundo o desembargador, em seu modelo atual o plano de carreira resulta em crescimento vegetativo da folha de pagamentos “incompatível” com a realidade orçamentária e fiscal do Poder Judiciário. Ele diz que dependendo dos requisitos atingidos por cada servidor do TJES esta progressão pode se dar em até 4 níveis da carreira por vez, representando uma possibilidade de aumento salarial de 11% a cada dois anos.
Ao mostrar o desequilíbrio nas contas da Corte, Ronaldo Gonçalves cita dados da Assessoria de Planejamento, Orçamento e Gestão Estratégica do TJES, segundo os quais, mesmo com medidas de sobrestamento de gastos visando ao equilíbrio fiscal, resta um passivo a ser quitado relativo a promoções que totalizam R$ 49,6 milhões.
Do total, R$ 15,4 milhões são referentes às promoções de 2017 e R$ 34,2 milhões relacionadas às movimentações na tabela funcional ocorridas em 2018.
Singularidade
O desembargador vai além ao advertir sobre a necessidade de conter o crescimento vegetativo da folha.
Ele relata que, nos autos do Processo TC 2090/2016, que trata da Prestação de Contas Anual do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo no exercício de 2015, o Tribunal de Contas (TCE-ES) recomendou a “estrita” observância às determinações contidas na Lei Estadual 10.470/2015. “Notadamente no que se refere à suspensão dos efeitos financeiros das promoções de servidores deste Poder, enquanto não houvesse o equilíbrio da gestão fiscal”, alerta.
A singularidade do TJES no desequilíbrio das contas na esfera estatal é verificada em trecho no qual o desembargador Ronaldo Gonçalves pontua que se trata de situação que se restringe aos servidores do Poder Judiciário do Espírito Santo.
Direitos adquiridos
Ronaldo Gonçalves lembra de aspectos legais que envolvem a questão, e argumenta no texto enviado aos deputados que “ainda que não se possa pensar na adoção de medida que afete o direito garantido dos servidores do TJES”, o atual desenho de progressão funcional representa um crescimento da folha que ameaça a contenção de gastos.
Assim, diz ele, dentre as ações a serem implementadas pelo TJES para solucionar o problema é importante que a Corte estude formas de alterar a estrutura salarial, seja para os futuros servidores ou para os atuais “respeitando-se, obviamente, os direitos adquiridos”.
Oficio ao sindicato
O presidente do TJES afirma no texto que acompanha a matéria que encaminhou ofício ao Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário (Sindijudiciário/ES) solicitando sugestões que pudessem subsidiar estudos sobre as alterações no plano de cargos e salários.
Em resposta, acrescentou Gonçalves, a entidade sindical ponderou, em síntese, que o plano de cargos e salários dos servidores não pode ser visto como o único ou principal fator responsável pela situação financeira enfrentada pelo Poder Judiciário, haja vista a existência de outras causas que devem ser analisadas.
“Concluiu (a entidade), ao final, que não possui nenhuma sugestão, mas que tem interesse em participar dos estudos e, oportunamente, apresentar considerações”, citou o desembargador.
Fundo do Judiciário
O TJES encaminhou outro projeto à Ales. O PL 266/2020, além de alterar a redação do artigo 2º da Lei Complementar Estadual 219/2002, que instituiu o Fundo Especial do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo (FUNEPJ), inclui parágrafo único no dispositivo vedando uso dos recursos do fundo para pagamento de salários e encargos.
O novo texto do artigo, em versão mais enxuta, diz apenas que “o Fundo Especial (do Judiciário) tem por finalidade assegurar recursos para manutenção, expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional, visando ampliar o acesso à Justiça e o cumprimento das demandas judiciais de forma efetiva, adequada e em tempo razoável”.
A Mensagem que acompanha o PL data de 1º de novembro de 2019 e é assinada pelo ex-presidente do TJES, Sérgio Luiz Teixeira Gama. No texto, Gama afirma que “resta evidente” que no formato atual a redação do artigo 2º possui “elevada abrangência interpretativa”, o que pode, na sua opinião, gerar dúvidas em algumas situações quanto à devida destinação dos recursos do FUNEPJ.
O artigo 2º em vigor é um pouco longo e especifica várias finalidades, entre elas construção, ampliação e reforma de prédios próprios do Poder Judiciário, conservação de imóveis, bem como despesas de capital e de custeio. O desembargador cita que em Minas Gerais e São Paulo também estão sendo enxugados os artigos de leis que definem os objetivos dos fundos dos Tribunais de Justiça como forma de diminuir as margens de interpretação das possíveis destinações orçamentárias.
As duas iniciativas aguardam manifestação da Presidência.