Eles conquistam espaço por causa da transparência e do engajamento real
Até 2017, eram os macroinfluenciadores e as celebridades que tomavam conta das redes sociais com seus milhares e milhões de seguidores. Bastava Kim Kardashian (154 M de seguidores) mostrar um decote, que milhares de pessoas apertavam o like. E não parou por aí. Em fevereiro de 2018, sua irmã Kylie Jenner publicou uma foto no Instagram que se tornou a imagem mais curtida da história da rede social até que o ig @world_record_egg fez um desafio para bater esse recorde, usando a foto de um ovo. E conseguiu: 54 milhões de curtidas contra 18 milhões de Kylie com a filha Stormi. Já era um sinal dos tempos? Uma crítica fantasiada de humor? O fato é que curtidas vazias são a cara da consumista turma millennial e não agradam a consciente geração Z. Foi assim que, em 2018, começou a crescer a relevância dos microinfluenciadores, que têm de 10 mil a 100 mil seguidores, e fez com que evidência e influência não andassem mais juntas. Agora, é a vez dos nano influencers, a turma que não passa dos 10 mil de público, mas vem abalando o mercado de consumo. A diferença? São engajados e têm voz ativa em seu pequeno, porém fiel, grupo.
Foi tentando descobrir qual rumo a influência vai tomar neste ano que a empresa de pesquisa de comportamento e tendências Box 1824 e a plataforma digital focada em discutir a cultura da internet YouPix passaram 2019 envolvidos em um estudo sobre o tema. Especialistas foram entrevistados, betas (pessoas relevantes em certos grupos) monitoradas nas redes sociais e uma ampla coleta de dados secundários serviram de base para as conclusões, que garantem que os nanos serão os influenciadores de comportamento da vez.
Paula Englert, CEO da Box, conta que começou a perceber o movimento dos pequenos quando, em outras pesquisas, os betas listavam como referências nomes com pouquíssimos seguidores e, às vezes, até mesmo sem rede social. Algo improvável quando se pensa que alguns anos antes havia um mercado de venda de likes que criava uma sensação fake de engajamento e interação baseada em números. “A partir desse ponto, começamos a estimular nas nossas pesquisas de campo alguns nomes dos ditos ‘grandes influenciadores’. Percebemos que eles eram conhecidos, mas não eram referência em suas vidas, principalmente quando o assunto era alguma tomada de decisão”, diz Paula.
De acordo com a pesquisa, a grande diferença entre um macro e um nano, para além do abismo em números, é uma conexão verdadeira com a sua audiência. “Os nanos estão dentro dos mesmos universos que seus seguidores. Outra característica importante é mostrar vulnerabilidade e emoção. A verdade e a transparência estão estampadas na cara do influenciador do futuro”, define Paula, que indica a “bicha negra cristã e ativista, tentando encher o mundo de amor e viadagens” Murilo Araújo (@muropequeno), a youtuber Gabi Oliveira (@gabidepretas), a “FashionPobre, favelada & criadora de conteúdo” Luci Gonçalves (@lucigoncalvesa), entre outros como expoentes dessa nova geração.

E quem influencia os nanos? “Seus universos, ecossistemas e a troca com a própria audiência. Essa retroalimentação de referências e cumplicidade para falar, escutar e discutir é fundamental. De uma maneira nova, a principal inspiração acaba sendo seu próprio seguidor”, destaca Paula.
Ainda de acordo com a pesquisa, para ser influenciador é preciso estar conectado com a comunidade, ser fomentador de conteúdos e ações, ter coerência e clareza em suas posições e, um dos mais difíceis, construir a sua autenticidade. “Para ser único, é preciso expor fraquezas e assumir seus erros, ser original e ter ousadia”, lista Paula.
A comunicadora, youtuber e ativista de Niterói Gabi Oliveira, de 27 anos, é uma das betas que Paula acompanhou em sua pesquisa. No De Pretas, cria conteúdo para a população negra e seu desafio, ela conta, é se manter relevante. “Entendi que influenciava pessoas logo no início. Achei que seria um hobby, mas, no terceiro vídeo, sobre palavras que precisavam ser banidas do nosso discurso, percebi o quanto aquilo repercutiu e que eu deveria entender aquelas postagens como trabalho. Não por uma questão de remuneração, mas por estar criando um canal com uma comunidade”, lembra.
No perfil de Gabi, o que é publicado são causas negras, mas sem clichês. Seu rol de seguidor é formado em sua maioria por mulheres afrodescendentes, entre 20 e 35 anos, de São Paulo, Rio e Salvador. “Meu principal propósito é construir uma nova visão sobre o que é ser negra, sem os estereótipos. Quero entender quais os debates são mais interessantes aos meus seguidores. Tudo isso sem perder a essência e os valores. Não se pode focar apenas no engajamento e no alcance. Em se tratando de nano, não vale tudo. Por isso, volta e meia, há uns tantos que caem e são criticados por criarem conteúdos considerados problemáticos”, alerta.
Entre macros e nanos, há ainda outra tendência, a turma “Exit”, que simplesmente cansa de influenciar e sai das redes. A empresária carioca Carol Buffara é uma delas. Fechou sua conta com mais de 500 mil seguidores e fez uma nova para apenas 300 amigos. Quando ela começou, há uma década, quase não havia brasileiros com mais de 100 mil followers no Instagram. “Ainda não se pensava nisso como uma profissão chamada de influenciador. Todo o meu trabalho se desenvolveu de maneira orgânica. Eu fazia o que gostava e as pessoas interagiam. Foi então que, de repente, o meu diário virtual ganhou proporções que eu jamais imaginei e marcas passaram a me procurar. Virou uma responsabilidade. Meio milhão de seguidores era algo inimaginável para alguém que nunca foi atriz na televisão, posou nua ou fez política”, lembra ela. Só fazem três meses que Carol está fora das redes, mas há mais de um ano ela já refletia sobre isso. “Fui aos poucos me desconectando, recusando propostas de trabalho que não condiziam mais com o meu momento. A privacidade voltou a ser meu foco central.” A mudança para Campinas com a família foi a gota d’água para sair definitivamente das redes. Ela conta que nesse tempo realizou um sonho antigo: “Estou cultivando uma horta e algumas árvores frutíferas, comendo muito do que eu mesma planto. Agradeço por tudo o que vivi, aquele ritmo me faz apreciar com mais intensidade todos os segundos que agora estou vivendo.”
Fonte: G1.