Negociação do governo com o Centrão irrita antigos aliados de Bolsonaro
Governo dobra os joelhos à velha política, diz Delegado Waldir sobre oferta de cargos por apoio no Congresso; problema é a demagogia, afirma Julian Lemos
Muita gente ficou sem entender quando o presidente Jair Bolsonaro gritou “não vamos negociar nada”, durante a manifestação a que se juntou no domingo 19 em frente do quartel-general do Exército, em Brasília. O que parecia apenas a repetição de um de seus mantras de campanha foi, na verdade, uma espécie de ação preventiva, na tentativa de neutralizar as notícias — que já vinham circulando, mas tomariam volume esta semana — de que o governo está em plena negociação de cargos com partidos do Centrão, o maior bloco de de deputados federais, em busca de apoio no Congresso.
Não adiantou. “Diante da inépcia de seus articuladores políticos, o governo está dobrando os joelhos à velha política”, resumiu o deputado federal Delegado Waldir (PSL-GO), que, na condição de líder do partido que já abrigou Bolsonaro – e que o levou ao poder na eleição de 2018 -, sempre foi um defensor do atual governo
O assunto começou a pegar fogo entre antigos aliados depois que começou a circular em Brasília que o governo acertou com o PL, de Valdemar da Costa Neto – uma das principais figuras envolvidas no chamado escândalo do mensalão, durante o governo Lula -, o comando do Banco do Nordeste e da Secretaria de Vigilância em Saúde (cargo tocado pelo secretário Wanderson de Oliveira, que era um dos principais auxiliares do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, e que ficou famoso nas coletivas do ministério, especialmente depois que pediu demissão, que não foi aceita pelo então chefe).
Nas últimas semanas, Bolsonaro já havia conversado com o senador Ciro Nogueira, presidente do PP, e o deputado federal Marcos Pereira, presidente do Republicanos, outros dois promeninentes líderes do Centrão. Também se encontrou o deputado Arthur da Lira (PP-AL), Wellington Roberto (PL-PB e Diego Andrade (PSD-MG), todos com algum cargo de liderança em suas legendas. Pelos bastidores da capital federal também é dado como certo que o PP passará a responder pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento (FNDE) e o Departamento Nacional de Obras Contra Secas (Dnocs)
As negociações têm provocado a fúria de apoiadores tradicionais do governo. O deputado federal Julian Lemos (PSL-PB), um dos mais ativos na campanha de 2018, disparou pelo Twitter: “Agora temos uma ‘aliança pelo Brasil’, e ela já tem seu fundo eleitoral, Banco do Nordeste, Funasa”, referindo-se ao partido Aliança pelo Brasil, fundado por Bolsonaro e que ainda busca registro na Justiça Eleitoral. A VEJA Lemos afirmou: “O problema não é o Centrão, mas a demagogia desse governo, e, pior ainda, a sua inabilidade política. ‘Negociar’ não é palavra proibida. A negociação pode ser totalmente republicana, discutida no mérito, mas o próprio Bolsonaro destrói a política atacando todos, quem merece e quem não merece”.
De acordo com o deputado, a gestão Bolsonaro foi absolutamente inábil desde o início do mandato. “Esse governo destruiu as conexões políticas com o Congresso. Desprezou e denegriu a imagem de todo o Legislativo, batendo até naqueles que o apoiavam — e ainda apoiam — sem pedir nada em troca. Agora está procurando garantir a governabilidade com negociações de custarão muito caro. Por que precisa dar banco em troca de apoio?”, concluiu o parlamentar.
A inabilidade política do governo também é apontada por Delegado Waldir. Segundo o parlamentar, nem o líder do governo na Câmara, deputado Major Victor Hugo (PSL-DF), nem o ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, vêm atuando com eficiência para garantir vitórias do governo no Legislativo. Exemplo disso, explica Waldir, foi a “derrota fragorosa” na semana passada, quando a Casa aprovou por 471 votos a ajuda a estados e municípios, sem a definição de contrapartidas. “Eu fui um dos 70 que votaram contra a farra fiscal, mas votei por coerência. A liderança do governo e a Casa Civil ficaram de braços cruzados”, completa.
Governo enfrenta crise após contradições sobre Bolsa Família e denúncias de irregularidades em contratos de alimentação
Uma nova crise se instalou no governo federal, após a Casa Civil contradizer o ministro Wellington Dias sobre um possível aumento no Bolsa Família. Dias havia declarado que o reajuste “está na mesa”, o que gerou descontentamento no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e mobilizou outros membros da administração. A Casa Civil, por sua vez, afirmou que não existem estudos em andamento sobre o aumento do benefício e que o assunto não está sendo discutido. Paralelamente, o Ministério do Desenvolvimento Social se vê envolvido em denúncias relacionadas a irregularidades em contratos com organizações não governamentais. Um dos contratos, no valor de R$ 5,6 milhões, tinha como objetivo a distribuição de refeições para pessoas em situação de vulnerabilidade social. No entanto, surgiram dúvidas sobre a efetiva entrega dos alimentos, o que levantou suspeitas sobre a utilização dos recursos.
Diante das acusações, o ministério decidiu acionar a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União para investigar a aplicação dos recursos públicos. A situação gerou um clamor entre os parlamentares, que solicitaram a suspensão dos repasses financeiros até que as investigações sejam concluídas e as suspeitas sejam esclarecidas. O governo se comprometeu a adotar medidas rigorosas caso as irregularidades sejam confirmadas. A situação atual reflete um momento delicado para a administração, que busca manter a confiança da população e a integridade dos programas sociais.
Supremo Tribunal Federal adia análise sobre legalidade de revistas íntimas vexatórias em presídios, com julgamento previsto para 12 de outubro
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu adiar a análise sobre a legalidade das revistas íntimas vexatórias em unidades prisionais, uma prática que busca impedir a entrada de substâncias ilícitas, armas e celulares. O julgamento, que teve início com os votos dos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, será retomado na próxima quarta-feira, dia 12, com a expectativa de que os outros nove ministros se manifestem. A discussão na Corte se baseia em um recurso apresentado pelo Ministério Público, que busca reverter a absolvição de uma mulher flagrada tentando entrar em um presídio de Porto Alegre com 96 gramas de maconha escondidas. A Defensoria Pública argumentou que a revista íntima realizada foi ilegal, o que levou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a decidir pela absolvição da acusada.
O relator do caso, ministro Fachin, expressou sua posição contrária à prática das revistas íntimas vexatórias, ressaltando que a retirada de roupas íntimas deve ser justificada. Ele sugeriu que a revista manual só seja autorizada quando houver indícios concretos de que objetos proibidos estão sendo introduzidos, recomendando o uso de equipamentos como scanners e raio-x. Fachin também estabeleceu um prazo de 24 meses para que os presídios adquiram esses dispositivos.
Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes apresentou uma visão divergente, defendendo que a revista íntima pode ser realizada mesmo na falta de equipamentos de raio-x, desde que haja consentimento do visitante e que a inspeção seja feita por agentes do mesmo sexo. Moraes alertou que a ineficácia de revistas superficiais pode resultar em problemas, como a suspensão de visitas em presídios que não possuem tecnologia adequada, o que poderia desencadear rebeliões.